Corpo são, mente sã?

A pandemia de coronavírus e os transtornos mentais

Por Thiago Martins Tozi

Números de tirar o sono

Se o distanciamento social, por um lado, foi a principal medida adotada para frear a pandemia de coronavírus pelo mundo, por outro, é fato que o isolamento tem impacto sobre nossa saúde mental. No dia 13 de Maio, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou um relatório alertando sobre o risco da pandemia de COVID-19 afetar gravemente a saúde psíquica não só de profissionais da saúde como também da população em geral. O documento recomendava, ainda, que estratégias para prevenir ou amenizar os efeitos psicológicos da crise sanitária deveriam acompanhar a adoção de medidas para conter o avanço do vírus. No Brasil, o governo federal sabotou, de todas as formas, as medidas para conter a disseminação do vírus e, até agora, o que temos aqui no país dos Bolsonaro são algumas pistas de como a pandemia afetou a sanidade mental do brasileiro:

  • o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) constatou que, entre janeiro e julho, as 80 mil drogarias do país compraram dos fabricantes 97 milhões de caixas de ansiolíticos, estabilizadores de humor e antidepressivos. São números bem maiores do que em anos anteriores. Nos primeiros sete meses de 2018 e 2019, as farmácias adquiriram 74 milhões e 82 milhões de caixas, respectivamente. Se ficarmos apenas na fase de distanciamento social (março a julho), foram 74 milhões em 2020, bem mais que os 59 milhões do mesmo período de 2019;
  • entre 25 de abril e 5 de maio, o Ministério da Saúde telefonou para 2 007 adultos de todo o país: 42% dos consultados relataram alterações no sono durante a quarentena (insônia ou muito sono), 39% se disseram com falta de apetite ou vontade excessiva de comer, 35% declararam pouco interesse em realizar tarefas cotidianas , 35% alegaram se sentir para baixo e 31% manifestaram perda de energia;
  • dados do Ministério da Saúde mostram que os números de socorros por uso de alucinógenos feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) cresceram 54% de março a junho quando comparados com o mesmo período do ano passado;
  • o atendimento por uso excessivo de sedativos aumentou 50% no período da pandemia enquanto o uso de maconha cresceu 36%, patamar próximo (35%) do quanto subiram os casos de intoxicação por álcool e drogas no Rio de Janeiro.

Em pesquisa conduzida pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)  e coordenada pelo Yale New Haven Hospital e a Universidade de Columbia  para detectar se os entrevistados apresentaram distúrbios psíquicos enquanto se isolavam, 1.460 participantes de 23 cidades brasileiras responderam dois questionários online, o primeiro no fim de março e o segundo em meados de abril, obteve as seguintes conclusões:

  • no fim de março, portanto início da quarenta, 4,2% dos entrevistados exibiram sinais de depressão , 6,9% de estresse e 8,7% de ansiedade. Em abril, os índices obtidos foram de 8% (3,8% a mais) para depressão, 9,7% (2,8% maior) e 14,4% (5,7% a mais que em março);
  • as mulheres se mostraram mais suscetíveis às psicopatologias;
  • participantes que precisavam quebrar o confinamento para trabalhar também se mostraram mais suscetíveis em relação àqueles que faziam home office;
  • quem morava com idosos, obesos, hipertensos, diabéticos ou cardiopatas se mostrou mais propenso à doenças emocionais;
  • os que tinham criança em casa desenvolveram menos sintomas;
  • quanto maior a escolaridade do entrevistado, menor a incidência de distúrbios;
  • quanto mais regular a prática de atividades físicas ou quanto mais equilibrada a dieta, menor a ocorrência de problemas mentais.

Ansiedade e depressão

Outro estudo da UERJ mostrou crescimento de quase 50% nos casos de depressão e 80% nos números sobre ansiedade desde o início da quarentena no Brasil.  A pesquisa também mostrou que as mulheres estão mais propensas a sofrer com estresse e ansiedade durante o isolamento social, especialmente aquelas que tem que sair de casa para trabalhar, as que têm doenças preexistentes e são sedentárias. O brasileiro é povo sulmericano que mais sofre de depressão (12 milhões) e ansiedade (18 milhões), além de ter um dos piores índices de estresse causado pela COVID-19, na frente da Índia e da China, ambas com 1 bilhão de habitantes.

As manifestações dos sintomas de ansiedade podem envolver sensações de medo e apreensão, pensamentos exageradamente catastróficos, além de sintomas físicos como dores de cabeça e nas costas. depressão é uma doença psiquiátrica crônica que produz alterações no humor caracterizadas por tristeza profunda e sentimentos de dor, amargura, desesperança, assim como distúrbios de sono e apetite. 

Como tratar?

Ansiedade e depressão são distúrbios psíquicos que podem ser tratados com a ajuda de psicólogos e psiquiatras, embora a psicoterapia seja indicada para todos, mesmo aqueles que não sofrem com nenhuma dessas psicopatologias. A terapia cognitivo comportamental (TCC) é a linha da psicologia com maior número de estudos positivos sobre sua eficácia no combate à depressão, transtornos de ansiedade, transtorno-obsessivo-compulsivo (TOC), transtornos alimentares (bulemia e anorexia), estresse crônico e traumas. Outros estudos também reforçam a importância da atividade física para o bem-estar psicológico, principalmente porque o esforço físico promove a liberação de endorfina, o “hormônio do prazer”, além de estimular o crescimento de células do cérebro responsáveis pela memória e humor. Vale pedalar para chegar ao trabalho ao invés de andar de ônibus, mas se não tiver jeito, pare algumas estações e vá à pé pelo resto do caminho. Caminhar em parques também pode ser uma boa em tempos de pandemia porque dá para manter o distanciamento social e, se não teve jeito e você foi trabalhar, suba de escadas: você faz um esforço pequeno e evita aglomeração dentro da cabine do elevador. 

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